terça-feira, 24 de maio de 2011

O Ultimo Beijo Capítulo 24

Entramos no carro novamente, Gabe dirigiu por alguns minutos e paramos na frente de uma casa. A minha casa, quer dizer a antiga.

- Gabe deve ter alguém morando aqui. – Iriam chamar a policia se vissem dois adolescentes rondando a casa.

- Não tem, já verifiquei. Seu pai nunca vendeu a casa, ainda é de vocês.

- Serio? – Meu pai havia me dito que tinha vendido.

- Serio, quer saber a melhor parte?

- E tem melhor parte?

- Sim, as coisas da sua mãe estão todas aí dentro, no sótão.

- Como sabe disso?

- Porque já entrei na casa.

- Gabe!

- Foi por um bom motivo.

- Que é?

- Você. – Ele me puxou para dentro da casa, abriu uma das janelas da cozinha que estava com o trinco estragado, pulamos a janela e fomos para o sótão.

- Cuidado com a cabeça. – Ele me disse. – Quero que veja isso, vou acender a luz. – Ele puxou uma cordinha e tudo se iluminou.

Definitivamente as coisas lá eram da minha mãe, tinha um espelho enorme com uma barra fixa a ele, no canto superior uma foto dela, dançando, era bailarina, a foto era em preto e branco como a do tumulo e ela parecia estar sempre feliz.

- Não sabia que ela dançava. Nunca entrei aqui antes, era pequena quando nos mudamos.

- Imaginei que você fosse gostar, olha só esse baú. – Ele apontou para o chão, no baú estava escrito Ciça. Entendia agora porque ele a chamava assim.

Abri o baú, tinha cheiro de velho e acho que o cheiro dela. Havia sua roupa de balé, gasta e toda amarelada, umas roupinhas de bebe, na tampa do lado de dentro tinha uma foto do meu pai e ela, abraçados, sorrindo, ele nunca sorria, não para mim.
Embaixo de tudo tinha um caderno, embrulhado em um pano, o retirei de lá, era o diário dela. Abri em uma pagina aleatória.

“Hoje é o dia mais feliz da minha vida, Alberto e eu descobrimos que vamos ser pais, finalmente o teste deu positivo, não vejo a hora de segurar meu bebe no colo”

Estava chorando de novo, meu pai nunca demonstrou afeto por mim, mas ali estava a prova de que eu era amada, abri em outra pagina.

“O bebe mexeu hoje, queria que Alberto estivesse aqui para senti-la, é uma menina tenho certeza disso”

Folhei as paginas mais um pouco.

“Depois de discutirmos muito, Alberto e eu chegamos em um acordo, se for menina eu escolho o nome, se for menino ele escolhe, mas tenho certeza que é a minha Jasmim”

Meu pai sempre me disse que ela escolheu meu nome, mas vê-la falando de mim assim, era... Tudo o que sempre sonhei, continuei lendo vários trechos.

“A Jasmim não me deixou dormir a noite toda, não parava se de mexer, estou muito ansiosa para ver seus olhinhos, sentir seu cheirinho, lhe contar historias antes de dormir.”

“Quero vê-la crescer e estar lá quando arrumar seu primeiro namorado, ela é a melhor coisa que já me aconteceu”

Ouvimos algumas vozes perto da casa, Gabe foi olhar através de uma janela pequena e redonda, fui atrás dele, tinha algumas pessoas olhando o carro, mas elas eram estranhas, me davam arrepios, estavam todos de preto, como se fosse um uniforme ou sei lá o que.

- Merda. – Gabe disse, me puxando para fora do sótão.

- O que foi Gabe? O que isso significa?

- Que não fiz minha lição de casa como deveria.

Começamos a descer a escadinha que dava para o sótão, Gabe fez sinal para ficarmos quietos, alguém forçava a porta da frente, era questão de minutos até eles chegarem a janela da cozinha, que estava aberta. Esperamos um pouco, resolvi voltar ao sótão, Gabe veio atrás feito louco.

- O que está fazendo? – Ele perguntou sussurrando.

- Vim buscar o diário. – O havia deixado no chão.

- Venha Jasmim, não temos tempo.

- Quem são eles?

- Onde está o espelho? – Não acreditei naquilo, porque ele queria um espelho agora?!

- No chão do carro.

- Droga! A coisa pode ficar feia, dessa vez quando te mandar correr corra. – Fiz que sim com a cabeça, abracei o diário da minha mãe e nos esgueiramos pela casa.

Aqueles caras haviam cercado a casa, estavam por todos os lados, ouvimos um barulho na cozinha, eles estavam entrando, de algum modo sabia que aquilo não era bom. Gabe abriu uma gavetinha próxima à porta, meu pai guardava as chaves naquele lugar, disso eu lembrava.

- Jasmim, quero que abra a porta e não importa o que aconteça ou o que ouça, corra, o mais longe e rápido que puder, pegue um ônibus para casa, de preferência vá para a casa da Ana. – Não estava gostando nada daquela historia.

- Mas e você?

- Vou ficar bem.

- Não vai não – Ele me olhou incrédulo. – Você está mentindo.

- Preciso que você vá.

- Não vou a lugar algum sem você. Quem são essas pessoas?

- Caçadores.

- Caçadores do que? – Na mesma hora que perguntei, meu subconsciente me deu a resposta, estavam caçando Gabe, seja lá o nome do que ele era, estavam caçando isso. – Oh meu Deus. Gabe?

- Vou ficar bem, se você sair daqui, me saio melhor sozinho.

- Tudo bem, mas não vou para casa... - me calei, tinha alguém passando no outro cômodo da casa, estava tremendo dos pés a cabeça, Gabe colocou sua mão tapando minha boca.

- Te encontro na sua casa. Vai. – Levantei contra minha vontade e corri até a porta, passei pela figura de preto e o olhei de relance, ombros largos, alto, olhos... Não sei definir mais eram bem estranhos.

Parei na frente da porta, mas tremia tanto que não conseguia achar a chave, que estava no molho que Gabe havia colocado na minha mão, o chaveiro caiu no chão, o tal de caçador estava se aproximando, mas ele não corria, como se não tivesse pressa de me pegar.
Olhei para trás, aqueles olhos eram muito estranhos, não eram brancos, mas não conseguia olhar para eles, como se alguma coisa me fizesse recuar. Gabe se levantou e parou um pouco atrás do cara.

- Estou aqui. – Ele estava de olhos fechados.

Meu desespero só aumentou, o cara foi na direção de Gabe e eles começaram a rolar pelo chão, o cara gritava “Olhe para mim” e Gabe continuava com os olhos fechados, ele não agüentaria lutar por muito tempo daquele jeito.
Finalmente consegui achar a chave e abri a porta, sai correndo, dois caras pularam em cima de mim, cai de boca no chão, senti o gosto de sangue.
Um dos caras saiu de cima de mim e correu para dentro da casa, correu para ajudar a pegar Gabe. Me debati, joguei terra que consegui pegar do chão, nos olhos do caçador, ele levou as mãos ao rosto, levantei e corri, estava chegando a esquina, quando ouvi os berros de Gabe, aquilo ecoou pela minha alma.
Parei de correr, olhei em volta, vi um taco de beisebol, era aquilo mesmo que usaria, peguei o taco e voltei correndo. Chegando lá não tinha mais ninguém fora da casa, estavam todos lá dentro, Gabe não parava de gritar.
Não pensei duas vezes, quebrei o vidro do carro e abri a porta por dentro, não conseguia achar a bosta do espelho, cortei minhas mãos nos cacos de vidro, mas finalmente o achei, peguei o espelho e o taco, entrei na casa.
A cena que vi era perturbadora, havia quatro homens em cima de Gabe, ele estava ensangüentado, de olhos fechados, mal respirando.

- Hey. – Berrei. O cara mais próximo a mim me olhou e o acertei com o taco, bati o mais forte que consegui. – Gabe. – Ele virou a cabeça na minha direção. – Pegue. – Joguei o espelho para ele, deduzi que era disso que ele precisava. Ele agarrou o espelho no ar, não sei como fez isso de olhos fechados.

Outro cara partiu para cima de mim, tentei acertá-lo, mas ele desviou, estava bom demais para ser verdade, ele tirou o taco das minhas mãos sem nenhuma dificuldade e me acertou bem no estomago, cai sentada, aquilo doía e muito. Olhei para Gabe, ele segurou o espelho de frente para seu rosto e abriu os olhos, procurou os caras pelo espelho e no momento que um deles encontrou seu olhar, aquele olhar branco, caiu morto no chão. Simples assim. Seus olhos voltaram ao normal.
Gabe levantou, deu uma cambaleada e conseguiu acertar o terceiro homem, veio na minha direção, pegou minha mão e me levantou do chão. Meu coração martelava no peito, ele não parecia nada bem. O cara que me acertou tentou impedir que saíssemos, mas Gabe o acertou também, aquele espelho realmente fazia a diferença. Entramos no carro, os caras já estavam levantando, Gabe deu partida e saiu cantando pneu, ele não parava de olhar no retrovisor e sinceramente eu também não.

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